quarta-feira, 18 de abril de 2018

Me chamem "sapatão"!


Durante muito tempo, quando era mais nova, morria de medo que alguém me gritasse na rua "sapatão"! Não sabia direito o que era, mas só podia ser algo muito ruim, já que era um xingamento.
Durante muito tempo me escondia e tinha pânico que no interior onde eu morava, eu fosse "a fulana é sapatão!". 
Quando alguém me gritava "sapatão!", corria pra casa chorando e não adiantava casa, corrida, não tinha como me esconder de mim, não tinha pra onde ir. Descobri que o que era xingamento tinha a ver com escolhas, orientação, liberdade...
Parte das pessoas que me criticaram "viraram sapatão". Parte delas, nunca assumiram, nunca assumirão. Outra parte não entende, não aceita, não respeita, nunca entenderão. 
Eu entendi! Entendida... Sim! Fui e estou cercada delas, mulheres incríveis, supercompetentes, profissionais exemplares, amigas dedicadas, mães de família, do lar por que entendem o que isso de fato significa, professoras, diretoras, artistas, médicas, domésticas, policiais, engenheiras, musicistas, enfermeiras, cantoras, estudantes, militantes, atrizes, atletas, mestres de obra... Estou cercada de sapatão, tenho muito orgulho delas!
Tenho orgulho de mim e da mulher que me tornei, tendo todas elas como espelho e referência. 
Me chamem "sapatão"! Não me ofende. Não mais... Nunca mais!

Moon. Abr.2018 (para todas as minhas amigas "sapatão").

Foto: Ernani Pinho


sábado, 3 de março de 2018

De passagem

Eu não nasci do ventre de minha mãe.
Eu vim da Ilha de Gorée, muitos Atlânticos me atravessam até aqui.
Eu sou fruto do esperma e gozo daquele homem branco, do grito daquela Índia, daquela negra, que ainda ecoa aqui dentro...
Eu miro longe, minha história é ancestral e não estamos aqui a passeio.
Não tenho mais pressa, tenho muita fome e sede, também!
Moon. Mar. 2018.

Chapada Diamantina - BA 

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Quando acaba o carnaval...

Um nó na garganta,
Um choro que não se consumou, mas que ainda não foi de tudo represado.
A ansiedade do momento,
O medo do reencontro,
A espera que nunca findava,
Uma respiração quase esquecida,
Uma fraqueza quase imobilizante,
Um cheiro de tensão no ar,
O abraço prometido e tão frágil,
A palavra escassa,
Um silêncio perturbador,
O cumprimento distante...
Foi tão rápido quanto inesperado.
Tanta coisa por dizer e... passou!
Ali, na minha frente quase 1 ano depois... Quem é você? Sinto um vazio imenso, não mais reconheço. Vejo os mesmos olhos ternos, mas não mais ingênuos e um tanto frios. Te olho com calma e medo. Uma vontade de me proteger. Ali, diante dos olhos que foram seus, você! O amor que se foi sem dizer adeus, os olhos que um dia foram meus, o amor que dediquei infinito, o laço que julguei eterno, o motivo da minha maior alegria e maior tristeza também, uma parte do mais sagrado em mim... Ali, num janeiro qualquer, nos gritos de pré-carnaval, naquela calçada imunda, naquele barulho de carros, música alta e gente gritando, tudo ficou suspenso numa meia dúzia de palavras soltas, no beijo pras famílias, uma eternidade... Nos despedimos sem pressa e sem mais. Cada uma para um lado e sigo para a próxima folia, atônita e confusa com as memórias que voltam num filme. Sigo, pensando no que deixei pra trás. No que devo deixar para que eu possa seguir... A memória da pele é como tatuagem. Nunca será apagada, ela fica ali, esquecida, pode fazer outra por cima, mudar o desenho, mas nada vai apagar o motivo pelo qual você quis fazer e carregar pra toda a vida.
Passado o susto, a tensão, o suspense e o medo desse reencontro que não durou mais que 5 minutos, finalmente, fim!
Moon. Lapa, RJ - 28 de janeiro de 2018.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Rio eu te amo

Rio eu te amo.
O Rio é como ressaca: por mais que você saiba o resultado e prometa que nunca mais vai beber... quando assusta já foi.
É como um bofe de janela: bonito por cima, mas quando sai de casa e mostra os cambitos...
É como uma puta que foi linda, cortejada, hoje cansada e judiada.
É como uma pele linda, num reboco de base MAC que quando lava o rosto, a lua grita.
É como aquele playboy do Leblon que herdou o ap da família, vive de pompa no metro quadrado mais caro, mas não tem como pagar o condomínio.
É como um porco criado na merda, não sente mais o cheiro, por que se acostumou.
É como droga para os viciados, por mais que você saiba que faz mal, que não é legal, você não consegue largar.
É aquele pedido de tempo de um amor que nunca voltou, você fica ali, mesmo sabendo o final.
É o lanche do Mc'Donalds, sempre maior, mais saboroso e melhor no comercial.
É uma casa muito engraçada, não tinha porta, não tinha nada, nunca te convidam pra um café.
É uma onda de ácido: você nunca sabe o que é real de fato.
É Gil por que continua lindo, mas também é Caetano, "ou não".
É o fora Temer: todo mundo grita, mas o cara continua lá.
É Crivella: um lobo em pele de cordeiro.
É a "virgem" que dá apenas o furico pra casar na igreja, de branco e imaculada.
É o Cristo Redentor: intocável de tão alto, visto pelo mundo todo, mas não vê ninguém e só turista e gringo conseguem acessar.
É o viaduto de Madureira pra burguesia branca Zona Sul: todo o charme tá ali, mas só em dia de baile.
É o caranguejo mangue beat: na lama, andando pra trás, mas pulando ao som de Chico Science e Baiana System.
É o sem noção que chama o porteiro de Paraíba, mas passa todas as férias no Nordeste.
É a PM: todo mundo deveria se sentir protegido mas...
É a festa à fantasia: todo mundo fantasiado.
É o cais do porto, sempre movimentado, sempre solitário.
É a pegadinha sem graça do Faustão: te convida pra ir em casa, mas nunca te dão endereço.
É o signo de Leão, se acha mais que todo mundo, é a fila inteira do pão.
É a Casa Grande e Senzala separando morro e asfalto.
É o amor de carnaval feito pra acabar junto com a folia.
É a mãe coruja que só ela pode falar mal e se alguém escrever algo desse tipo, ela avança, bateeeeée e é capaz de matarhhhhhhhhsocorro!!!!!!

Moon. Jan. 2017

domingo, 21 de janeiro de 2018

E se cada amor que vivi eu inventei?
Sabe moço? Morro não!
De minha parte foi verdadeiro, intenso e inteiro.
Eu sei!
Moon. Jan. 2017.

                                                                              

                                                                 

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Notas femininas 8

Enquanto elas se amavam, 
Havia uma porta entreaberta entre o susto e o desejo. 
Ali, naquela cama, tudo o que não era delírio, era segredo.

                                                                     Moon. Jan. 2018

sábado, 30 de dezembro de 2017

Quando mar

O mar guarda todos os seus segredos. 
À sua mãe ela confiou todos os medos e toda virada de ano o mesmo ritual: flores ofertadas em gratidão, pedidos de paz e proteção renovados, pés que bebem água na beirinha lavando a alma, olhos que miram o horizonte sem pressa, rodando o filme do ano que finda.
Naquele 31 de dezembro, ela contou 5 conchas com os olhos, cada qual um presente, se despiu inteira, bateu cabeça pro mar e nunca mais foi vista. 
Dizem que ela finalmente encontrou sua morada. Outros dizem que a viram vagando ora nas conchas, ora num barco, no cais, nas ondas...
Desde que fez do mar sua morada, ela vive assim, livre, plena de si, refazendo cada gota que derramou pelo caminho e à cada mergulho ela renasce!

Moon. Dez. 2017.